Em todo o país, há desabastecimento de poliquimioterapia, esquema terapêutico utilizado nos últimos trinta anos
Desde 2016, o Ministério da Saúde oficializou o mês de janeiro e consolidou a cor roxa para campanhas educativas sobre a Hanseníase, visando à conscientização da população para uma patologia tão presente no nosso meio. A hanseníase é uma doença infeciosa, de alta infectividade e baixa patogenicidade, neurológica primária e que apresenta lesões dermatológicas. O Brasil ocupa o segundo lugar na detecção de casos novos diagnosticados, atrás apenas da Índia, quando realizado o cálculo de detecção de casos novos por 100.000 habitantes superamos a Índia.
Atualmente são diagnosticados 30 mil casos novos no nosso país, correspondendo pela grande totalidade dos diagnósticos no continente americano, sendo que certamente deixamos de diagnosticar muitos casos nos últimos anos devido à falta de campanhas nacionais, de treinamentos locais e da inclusão da Hanseníase nos vários cursos de medicina existentes atualmente no nosso país. Apenas por tudo citado anteriormente já seria esperado que tivéssemos cuidado especial com patologia infecciosa tão prevalente, infelizmente não foi o que ocorreu nos últimos anos, o que observamos na história recente no enfrentamento foi o descaso com a inclusão de novas drogas no esquema terapêutico, no fornecimento de novos exames complementares que poderiam auxiliar nesse difícil diagnóstico e no acompanhamento das sequelas de parte dos pacientes diagnosticados.
No final de 2020 e início de 2021 convivemos com o desabastecimento da poliquimioterapia, mesmo esquema terapêutico utilizado por volta de 30 anos, com alguns estados da
União apresentado falta das drogas utilizadas na terapia e nos surtos reacionais, desprezando as consequências de tal falta. Nos últimos anos a Sociedade Brasileira de Infectologia incluiu a Hanseníase nos Congressos Nacionais e Regionais, participou de várias discussões no Ministério da Saúde, colaborou com especialistas nas campanhas de treinamento e firmou uma parceria com a Sociedade Brasileira de Hansenologia, buscando sempre o ensino e a luta pelos direitos de nossos pacientes. Infelizmente o ano de 2020 para todos infectologistas foi marcado pela COVID-19, com desgaste físico e emocional da nossa vida pessoal e profissional, em relação à Hanseníase as consequências ocorreram na busca ativa de novos casos, dificultando muito o diagnóstico precoce e os treinamentos de equipes locais. Espero que nos próximos anos tenhamos JANEIROS ROXOS onde nossos pacientes desfrutem de novas drogas nos esquemas terapêuticos, de protocolos terapêuticos, de melhor qualidade das técnicas existentes (treinamentos para realização correta da baciloscopia do raspado), de acessos a novas técnicas de diagnóstico (técnicas moleculares e sorológicas como exemplo), inclusão social e cuidados com o preconceito, oferecendo uma vida com dignidade.
Márcio Gaggini é infectologista e coordenador do Comitê de hanseníase da Sociedade Brasileira de Infectologia