Brasil há um ano sem escolas
Ao completar um ano da pandemia de Covid-19, temos hoje uma noção muito maior de como o vírus se propaga. A principal via de transmissão do vírus SARS-CoV-2 é respiratória, e secundariamente, por contato.
O uso de máscaras respiratórias tornou-se a principal forma de contermos a disseminação, juntamente com a higienização das mãos. Higienização das mãos, friso. Não adianta lavar chão com hipoclorito e as mãos continuarem sujas, ou se retirar as máscaras para um “cafezinho rápido” com um grupo de amigos.
Conhecendo a transmissão, caminhamos para a prevenção. Por isso, todo o esforço de retorno à normalidade passou pelo uso de máscaras, somadas ao distanciamento. Isto porque as máscaras de tecido não garantem total proteção se a distância for menor do que um metro e se não houver a higienização das mãos.
Para os hospitais foi fundamental o uso de máscaras cirúrgicas ou PFF2/N95, luvas, aventais e higienização das mãos.
Milhares de pacientes foram atendidos por profissionais de saúde em hospitais e clínicas. Foram salvos por mãos limpas e profissionais dispostos a se proteger para salvar vidas. Eu mesmo passei esses longos meses em uso constante de máscara PFF2 e, até me vacinar, não tinha sido contaminado pelo Sars-Cov2, apesar de contato intenso e quase diário com pacientes com a Covid-19. Simplesmente porque a transmissão se faz dessa forma: gotículas respiratórias exaladas a pequena distância (< 1 metro) entre uma pessoa contaminada e outra não contaminada, ambas sem proteção respiratória.
Por isso, se justificou, ao longo da pandemia, a exigência de máscaras para acesso a praticamente todos os prédios públicos, shopping centers, academias esportivas, bares, restaurantes, hospitais, lojas e assim por diante, com a disponibilidade de álcool gel 70% nesses locais.
O retorno às atividades comerciais, a manutenção das atividades industriais, a permissão das atividades do setor de serviços, só se fez segura e possível devido a esses protocolos, relativamente simples e já conhecidos.
Então pergunto: por que somente as escolas ficaram de fora desse enorme esforço?
A justificativa banal e repetidamente proferida é que o retorno às aulas presenciais levará a uma explosão de casos da Covid-19 entre crianças, professores e, secundariamente, entre os próprios pais dos alunos, muitos com comorbidades.
Nessa visão, as salas de aulas seriam verdadeiros “Centros Experimentais de Transmissão Escolar da Covid-19” e, por isso, devemos mantê-las fechadas até o último paciente com a doença ou até que toda a sociedade esteja vacinada.
Pergunto: crianças, pais, professores e funcionários das escolas não se encontram com crianças, pais, professores, parentes, amigos, primos, irmãos? Não brincam em playgrounds, não se aproximam nem compartilham brinquedos? Não fazem refeições junto com outros parentes e amigos muito próximos?
Por que estamos em uma nova onda tão intensa da Covid-19 acometendo adolescentes eccrianças em idade escolar? Onde está o “Centro Experimental de Transmissão Escolar da Covid-19”? Fechado.
E será que há como transformarmos esses “Centros Experimentais de Transmissão Escolar” em “Centros Seguros de Educação”? Será que não podemos organizar o retorno às aulas de forma escalonada?
Podemos iniciar a retomada com o ensino médio, com medição de temperatura na entrada da escola, com obrigatoriedade de uso de máscara (de preferência cirúrgicas ou PFF2), com reorganização das salas de aula para o aumento da distância entre as cadeiras, com a presença de dispensadores de álcool gel 70% e incentivo ao seu uso, com escalonamento de horários de recreio e de alimentação, com treinamento de professores para essas simples medidas, com cartazes explicativos, e com monitores reforçando o cumprimento dessas medidas.
A partir do momento em que os ajustes forem sendo implementados e melhorados, podemos inserir, gradativamente, o 9º ano, depois o 8º e assim sucessivamente.
O Brasil é um dos países que está há mais tempo com as escolas fechadas desde o início da pandemia, segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). É uma vergonha para um país já tão carente de formação escolar adequada. A Sociedade Brasileira de Pediatria emitiu nota recente apontando para o retorno seguro às aulas presenciais, exatamente porque as salas de aula não serão locais de transmissão, se protocolos simples de segurança foram implementados.
Protocolos que incluem medidas básicas, simples e relativamente baratas quando comparadas
aos custos da assistência médico-hospitalar.
É possível o retorno às aulas presenciais. Precisamos, urgentemente, de um compromisso de toda a sociedade, envolvendo gestores, pais, alunos e professores, para iniciarmos já uma agenda de retorno seguro às aulas que deve se basear nas medidas já conhecidas de prevenção da transmissão da Covid-19.